SUA MENSAGEM

O causo de Mané Rapêgo

Mané Rapêgo, um crioulo bonachão, desses que aparece nos momentos certos da vida de uma cidade, um antigo funcionário da CODEVASF  que até os primeiros anos da década de 70, residia na Praça do Santuário (da Bandeira), vizinho do Bar Santo Rosa, de Nozinho de Canuto (falecido), quando esteve por aqui fez histórias. Antes de chegar à Lapa havia morado em Carinhanha e Juazeiro, cidades localizadas no médio São Francisco.
Becos     &     Boatos. 
Por que a história deixa marcas

Em Bom Jesus da Lapa montou um Boteco onde vendia os mais variados tipos de cachaça, brejeira e de Januária, pura ou com raízes, segundo ele, todas curavam doenças – até as contraídas através do ato sexual, para ele, “as mais perigosas”.
Para os seus desafetos, tanto vendia, quanto bebia. Servia uma cachaça para o freguês e outra pra ele.        
No momento que se aborrecia brigava com toda vizinhança.
- Quando estou “retado” tiro dos cachorros e boto neles, dizia.
Viado e ladrão eram as palavras que mais satisfazia a sua ira.
O sucesso empresarial de algumas pessoas da cidade o incomodava. Quando ouvia alguém dizer, por exemplo, que Fadu (falecido) e Carlitinho (Carlos Antunes de Souza), eram os homens mais ricos da cidade, ficava furioso, caminhando no passeio de sua casa, defronte do Boteco, resmungando, mas para ser ouvido, dizia:
- São ricos de merda!
- Se quer saber a verdade sobre a vida deles, “precura” os bancos! - finalizava.
Ou falava de sua má sorte na cidade de Bom Jesus da Lapa:
- Quando eu morava em Juazeiro, todo ano formava um filho. Aqui na Lapa todo mês tiro um da cadeia. 
Esses comentários circulavam na cidade e fez dele um tipo engraçado, folclórico, amado pelo povo.
De tanto se indispor com a vizinhança, foi obrigado a mudar de endereço. Foi morar na Rua do Hotel.
Lá continuou resmungando e fiel ao seu discurso:
- Quando eu morava na Praça da Bandeira, tinha um Boteco igual a esse. Abria às cinco horas da madrugada para atender os romeiros que iam e vinham da igreja, durante todo o dia e parte da noite. Só fechava depois das onze da noite, para descansar. Vendia muito. Estava para ficar rico.
Parava um pouco e, entre amargurado e feliz, continuava:
- Aqui na Rua do Hotel¹ abro o Boteco e fecho nos mesmos horários. Tem dia que não vendo nada, mas estou satisfeito.
E explicava:
- Olho a Rua de cima pra baixo e não vejo ladrão e nem viado.
Quando morou na Rua do Hotel era vizinho - de meia parede -, de Paulo Gabiru, um dos maiores compositores e instrumentista (violonista) do Estado da Bahia que, na época, iniciava sua vida profissional no Conjunto Os Terríveis.   
Gabiru, no final das semanas, se apresentava com o conjunto no Bar Tudo Azul, até o final da noite. A música mais cantada por ele, naquele tempo, repetia a última silaba da palavra, várias vezes – efeito tecnológico produzido por uma câmara de eco. E Paulo cantava, como na gravação original: “Estelaaaaaa, em que estrela você se escondeu...” Quando Gabiru chegava, com o sol já raiando, Mané Rapêgo ia à forra: ficava defronte da janela do quarto de Gabiru, até o meio-dia, repetindo sem parar, para impedir que ele dormisse: “Gabiruuuuuu”.    
Um dia um menino de outra rua, que não o conhecia, perguntou a uma vizinha, que se divertia ao lado:
- Dona esse velho é doido?
"Eita Lapa que dá doido".
Texto de Orlando Bastos Fraga 

Envie o seu causo para o Sarau:
Contato: irineumagalhaes@ymail.com

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